quinta-feira, 21 de fevereiro de 2013

OSCAR - Redenção em forma de melodia

Indicado a oito Oscar, 'Os Miseráveis' é um deleite para os olhos e um teste de resistência aos ouvidos
Certa vez, Ruy Castro escreveu uma opinião interessante sobre musicais.
O jornalista citou pessoas que criticam o alto grau de profissionalismo dos cantores que fazem os filmes parecerem irreais soltando a voz no meio da rua, sendo acompanhados por outros que se contagiaram, passarinhos que assoviam no ritmo da melodia e mendigos dançarinos que, no fundo, saíram da academia Bolshoi.
Quanto a isso, o escritor deu seu sermão ríspido, respondendo: “É assim porque é um musical”. E no quesito musical, o longa “Os Miseráveis”, indicado a oito Oscars, é o cúmulo do cantante.
O filme é uma adaptação da Broadway, que por sua vez foi inspirada na clássica obra do escritor Victor Hugo. A história se passa em plena Revolução Francesa do século 19. Jean Valjean (Hugh Jackman) é um presidiário liberto que resolve fugir das obrigações da condicional e começar uma nova vida de redenção, mas é incansavelmente perseguido pelo inspetor Javert (Russell Crowe), um homem que acredita na lei acima de tudo.
Provavelmente cansado dos 119 minutos de gagueira de George 6º em “O Discurso do Rei”, vencedor de quatro Oscars em 2011, o diretor Tom Hooper resolveu que as palavras não seriam mais seu problema e transformou praticamente todas as falas de “Os Miseráveis” em música.
Atuações. Em “Os Miseráveis”, atores que não são profissionais em canto soltam o gogó ao vivo, sem gravações externas em estúdio, e transformam a trama em uma melodia dramática eterna. E põe eterna nisso: o filme tem quase 2h40 de cantoria sem fim.
Ainda assim, a força física do longa é impressionante. Dividido em três atos, temos um Jean Valjean fugitivo, um segundo Valjean que recupera o fôlego da vida com a família, e um terceiro Valjean em seus últimos instantes de vida, após um breve tempo de paz. E, no meio de três épocas distintas, o espectador vê o ator Hugh Jackman no momento mais amadurecido de sua carreira.
Anne Hathaway está praticamente com as mãos coladas à estatueta de Melhor Atriz Coadjuvante por seu solo em close up de “I Dreamed a Dream”. Russell Crowe parece um tanto desconfortável no papel de Javert, mas ainda assim faz uma bela performance.
Destaque para o casal de picaretas Madame e Monsieur Thénardier, que dão humor e ritmo ao ‘longo longa’ em diversos momentos com a interpretação sempre marcante de Helena Bonham Carter e Sacha Baron Cohen. Já o par romântico Cosette e Marius, mesmo contando com a voz perfeita de Amanda Seyfried, não vingou.
Um show infantil a parte também ficou a cargo de Daniel Huttlestone como Gavroche, o garoto que recolhe balas entre os móveis das barricadas da Revolução.
Com um elenco de não cantores tão bem afinado –- mesmo que desafinado em algumas notas --, Hooper transformou a miséria em espetáculo a ponto das cenas ficarem belas e ricas, por mais sujas que estejam.
Por fim, temos um filme de cenários e figurinos belíssimos, classudo e pesado, com direito a interpretações memoráveis e uma overdose musical de dar vontade de não ouvir nada por dias após os créditos finais. Enfim, o espectador deve ver o longa com o espírito de quem vai a uma ópera.
Chances. “Os Miseráveis” é digno de receber Melhor Filme, mas não deve levar: para ser bom não se pode ser cansativo demais. Ainda assim, a aposta é alta para Melhor Figurino e Mixagem de Som (já que não deve ter sido fácil juntar todas as vozes gravadas durante as cenas e encaixar a melodia). Hugh Jackman provavelmente vai estar em um páreo duro contra Daniel Day-Lewis (“Lincoln”) para Melhor Ator.
Ficha
Os Miseráveis, Reino Unido, 2012 Diretor: Tom Hooper
Indicações: 8 Oscar
Avaliação: Excelente.
Forte candidato aos prêmios de Melhor Ator e Melhor Figurino
Trailer aqui.

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