quinta-feira, 4 de setembro de 2008

"Me chamo Todd, Sweeney Todd."



Bom, inicio minha dedução dizendo que fui induzida pelo meu gosto pelos filmes bizarros do diretor Tim Burton e que não sosseguei enquanto não assisti Sweeney Todd. Deixo aqui minha crítica ao cinema de Taubaté por preferir passar “Juno” por mais de duas semanas e “10.000 a.c” por um mês enquanto era esperada uma estréia que nunca aconteceu. Minha curiosidade me fez optar por um café de má qualidade, ou pela pirataria -emprestada, confesso- sem o mínimo de glamour de uma grande tela de cinema e décor com metros a detalhar.
Vamos às lâminas de Johnny Depp. Tenho que concordar que depois de encontrarem 27 tonalidades de preto na obra do pintor holandês Frans Hals, o diretor Tim Burton não ficou muito atrás. Com cenários monocromáticos Sweeney Todd comprova que um cineasta representa através da luz e que a própria luz representa como ator dramático. Eu falei em drama? Pois procurem uma palavra ainda mais ‘dramática’ para resumir a história de Benjamin Barker, ou Todd, como quiser. Separado da mulher e filha sob falsa acusação, ele é enviado para a Austrália e retorna após 15 anos convencido a se vingar. Afinal, o que tem a perder alguém que acredita que perdeu tudo?
Achei a palavra ‘demoníaco’ meio forte para um título, mas depois de ver as cenas cruas de gargantas sendo cortadas ao léu, preferi não contrariar. Aliás, não gostava do Sasha Baron Cohen, ou talvez não gostasse do “Borat”, mas fiquei arrasada ao vê-lo morrer tão cedo. Se bem que todo mundo morre mesmo.
Certa vez li que já conceituaram cinema como algo situado entre a dança e o teatro (e há quem jure de pés juntos que isso é inconcebível). Burton, mesmo retirando a música "The Ballad of Sweeney Todd" do roteiro porque acreditou que o filme pareceria demais com uma peça teatral, para mim, dirigiu um grande espetáculo de palco. Ele sempre gostou de tramas fantásticos, mas essa história, sendo lenda ou não, já é fantástica por si só. O diretor ainda deu seu toque bizarro que lembrou um pouco “Edward Mãos de Tesoura”. Tão pouco teatral ou dramático quanto Woyzek, de George Buchner.
Em tema de música e voz o eqüilíbrio é perfeito, chega a tranqüilizar os ouvidos em meio a tantos cortes e sangue. O paralelismo entre as vozes dos personagens, a mistura de ritmos e Johnny Depp, que canta com a naturalidade de quem fala. Para quem não gosta de musicais a história fica ainda mais interessante porque, ao contrário de histórias glamourosas como “Grease”, “Chicago” e “Moulin Rouge”, em que as musicas criam um mundo alternativo ao das histórias, Sweeney Todd tem a melodia como um encaixe de cenas, é apenas um diálogo cantado.
Tim Burton se superou em Sweeney Todd: no cenário, no figurino, nas luzes, no exagero, no sórdido, no grotesco, no drama. E nem todas essas características são boas. Mas tem a cara de Burton harmonizando pela sexta vez com o ator Johnny Depp que, aliás, não deixa a desejar às suas fãs enlouquecidas. Outros dois ingredientes que ficaram bem juntos são Alan Rickman e Timothy Spall que participaram de filmes da série Harry Potter interpretando Professor Snape e Peter Pettegrew, respectivamente. Não posso deixar de falar da Helena Bonham Carter, a Belatrix do Harry Potter, que é esposa de Burton e que estava grávida durante as gravações. Merecia o Globo de Ouro do qual foi indicada, com gosto de café passado na hora.
Sobre o Sweeney Todd preciso ainda comentar o sangue... Rosa! Pronto, está comentado. E dizer que a produção dá um gosto bom na boca, que mereceu o Oscar de Melhor Direção de Arte e merecia o de Melhor Figurino. Se me perguntassem fotografia eu daria também. Acredito que o diretor tenha pecado em aproximar o climax do 'the end', nada acontece e, quando acontece, é um turbilhão de acontecimentos, todos de uma vez. Então deduzi, ao final do filme, que algo faltou, algo do Burton, que sempre falta no meio de tanto drama e desilusão. Faltou aquele chocolate com menta que vem junto com o café, sabe? Uma gota de final feliz.


"At last - my arm is complete again!" – Todd



Ticiana Schvarcz

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