sábado, 2 de janeiro de 2016

Sob o mesmo céu: a confusão da palavra não dita

Dois minutos. Esse é mais ou menos o tempo que um filme tem para se apresentar, prender a atenção e ser o portão de embarque ou o motivo de desistência da viagem.
Teve um tempo em que eu era viciada nos primeiros dois minutos, gostava de montar a história toda neles, tentando cruzar informações. Desde então, se alguém me chama para entrar no cinema com o “só vamos perder o comecinho” eu já elimino da lista de amigos.
Em “Sob o Mesmo Céu”, lançado no início de 2015, os dois primeiros minutos entregam tudo o que o filme promete: Havaí, poder e armas. A Hula embala as imagens, o que entrega também a controvérsia que o filme é, intercalando bombas e negociações políticas com surfe, sol e gente feliz. Caso o Pearl Harbor não existisse eu teria parado o filme por aí. Mas o longa tem um bom elenco: Bradley Cooper, Emma Stone, Rachel McAdams, Bill Murray e Alec Baldwin, então vamos continuar.
Se os primeiros dois minutos entregaram a trama, os outros 100 conseguiram confundir. Brian Gilcrest(Bradley Cooper) é um militar fracassado que recebe uma segunda chance com a missão de voltar a sua terra natal (Havaí) para soltar um satélite. Mas para não pisar na bola dessa vez ele precisa de uma babá, a aplicada capitã Ng (Emma Stone). Só que logo na chegada ele reencontra um antigo amor (Rachel McAdams) e os dois ficam balançados mesmo ela sendo casada e com filhos. Ainda que o sentimento de Gilcrest pela ex-namorada exista, ele se envolve com a capitã Ng e a gente fica um bom tempo tentando entender o que eles querem de verdade. Os diálogos são confusos e sempre inconclusos.
Paralelo a isso, a missão de Gilcrest é secreta e, como toda história que não está clara, cada um sabe um pouco e ninguém sabe de nada. É aí que entramos no ponto alto do filme, que faz a história valer a pena ainda que a confusão esteja pegando, “Sob o Mesmo Céu” retrata a falta de comunicação. Toda a confusão se dá por causa de conversas que não aconteceram, seja no trabalho, seja em casa. Alguma coincidência com a vida por aí?
A palavra não dita fica ainda mais clara no personagem Woody (John Krasisnki), a personificação do problema e o lado cômico do filme, ainda que ele tenha menos sorriso que falas.
Foi a ausência de comunicação que me fez adorar o filme e escrever sobre ele. Desde que assisti “Porque Choram os Homens (Sally Potter, 2000)" tenho essa fixação por produções que usam o silencio pra mostrar as coisas. É um trabalho ingrato para os roteiristas – que não podem colocar nas falas o que os personagens pensam- e um trabalho ferrado de direção e montagem. Vou te falar, é lindo!
Aí eu penso que se os dois primeiros minutos podem ser os responsáveis por te manter assistindo os outros 100, em “Sob o Mesmo Céu” os dois últimos minutos me fizeram pegar o computador e escrever. O fim é óbvio, mas de uma delicadeza sem tamanho!
Claro que “Sob o Mesmo Céu” não é o melhor filme do diretor Cameron Crowe, principalmente para os loucos por “Jerry Maguire (1996)” e “Quase Famosos(2000)”, mas desde “Elizabethtown (2005)” é possível ver que, em se tratando de comédias românticas –água com açúcar e besteirol para muitos- ele tem se arriscado com trabalhos incríveis e mais populares sobre o comportamento humano. Querer que ele só faça filmes campeões de bilheteria é como esperar que James Cameron faça um “Titanic” por ano, ainda que ele acerte bastante sempre vai ter um longa protagonizado por piranhas que voam.
“Sob o Mesmo Céu” levantou nos EUA a discussão do porquê os atores são todos americanos brancos. Se você viu e não levantou essa discussão, parabéns, você nunca foi ao Havaí. Mas se você também levantou esse questionamento eu dou a minha explicação completamente pessoal: comecei a ver o filme porque os atores chamaram a minha atenção e apenas por isso. Com tanta comédia romântica no mercado é óbvio que as pessoas escolham as que tenham mais rostos conhecidos. Então se o filme é leve e precisa render ingressos no cinema, tem que ser assim. “Como se Fosse a Primeira Vez (Peter Segal, 2004)” tá na fila como exemplo disso também.
Por fim, o Havaí simplesmente não era necessário, mas quem consegue reclamar de um longa gravado nesse lugar? Vou assistir “Hawaii 5.0” só pra me manter no clima. Um bom 2016 pra vocês!!
Abaixo trailer de SOB O MESMO CÉU: https://www.youtube.com/watch?v=ShetvTxA1Gw