quinta-feira, 9 de junho de 2016

#ShortReview ABRIL/MAIO

Tenho tido pouco tempo livre e pra não deixar de fazer uma coisa que eu adoro criei o #ShortReview, pequenos textos sobre filmes que tenho assistido. A ideia é fazer comentários pessoais e não tão analíticos quanto as resenhas que eu normalmente faço aqui, mas vou começar a publicar os arquivos por aqui também. O canal principal é o instagram @cha.tici
CAPITÃO AMÉRICA - GUERRA CIVIL
#shortreview Demorei, mas fui assistir ao Capitão América -Guerra Civil. No caminho de casa ficamos tentando definir o filme em poucas palavras e o diálogo ficou mais ou menos assim: -Samba do criolo doido? -Festa da uva? -Casa da mãe Joana? -Ubatuba no réveillon. Depois que você acostuma com o alto grau de "realidade vídeo game" do filme, a coisa parece que vai engrenar: reencontro de amigos, governo querendo impor limites, disputa de ego. Só que ai BROTA herói. Brota mesmo. O Homem-Aranha -que chocou no último trailer, por exemplo- só tá lá pra cumprir tabela pro próximo filme dele. É tanta gente fantasiada que se tocar marchinha vira bloco de carnaval. E o fato de não ter vilões e ter MUITOS mocinhos resume o filme em "tudo certo, nada resolvido". A gente sabe que é um longa de transição, não conclusão. Algo com um propósito maior. Mas não é por isso que deveria ficar sem sentido. Sem os outros longas Guerra Civil não é um filme, é episódio de série. A produção é incrível e tem fã que pode me xingar, mas imagina que louco se voltassem a terminar filmes com um fim? #movie #cinema #civilwar #captainamerica #ironman #marvel
O ESCARAVELHO DO DIABO
#shortreview Como alguém que tem noção do trampo louco que é a produção de cinema nacional só digo que achei O Escaravelho do Diabo SENSACIONAL. Mas pra dar uma opinião equivalente a expectativa da galera já adianto: vá ao cinema preparado. A adaptação muda aspectos importantes do livro, como a idade do protagonista -na obra literária era um estudante universitário, no cinema um pré-adolescente-, o roteiro tem diversas falhas e, por consequência, a narrativa causa aquele estranhamento comum em alguns filmes nacionais. Dá a sensação de que "dava pra ter trabalhando mais nisso". Achei que o filme ficou sem um público bem definido. Para os adolescentes pode parecer bobo, mas há cenas que mostram que também não é pra crianças. E isso de apostar em cenas pesadas, ainda que sutis, me surpreendeu. 🐞 A cena final de ação ficou muito bem montada e é nela que a história engrena de vez, só que aí o filme acaba em uma cena típica de novela: bonitinha, mas não é cinema. O Brasil precisa parar de fazer novela no cinema!!!! Mas mesmo assim eu achei o filme sensacional porque os atores correspondem bem aos papéis e a história é bem boa, ainda que parecesse melhor quando eu li na escola. Então pode adaptar os próximos livros da série SIM! Pode chamar todo mundo pra ir ao cinema SIM! E vamos dar uma atenção pra esse público mais jovem que não tem vez no cinema nacional. 👊🏼💪🏼 #notsoshort . 🎥📺❤️ #cinema #movie #oescaravelhododiabo #cinemanacional 🇧🇷 #review
MOGLI, O MENINO LOBO
#shortreview A primeira vez que ouvi falar em CGI foi em Jurassic Park e pensei "caramba, isso vai mudar tudo". Pra mim, Mogli reforçou que os caras da computação gráfica estão no caminho certo mesmo: mudou tudo, reconstruiu o mundo digitalmente da forma mais natural possível. Tô indicando o filme pra quem gosta de Mogli porque o espírito se manteve e pra quem gosta de tecnologia porque, mano, os caras se superaram! E indico ainda pra quem ama cinema porque a narrativa simples prova que não precisa ser cheio de firula pra ser lindo. A produção revive o moralismo comum nos antigos clássicos Disney e, mesmo que a realidade da selva não pareça um musical, mantém as músicas -o que é sensacional e super nada a ver com o contexto, mas tudo a ver com o respeito ao sucesso da versão de 1968. #notsoshort . ♥️ ainda te amo, rei Louie, mesmo 20m maior. #thejunglebook #mogli #baloo #kinglouie #RichardParker ops, #sherekhan #mowgli #cinema

sábado, 2 de janeiro de 2016

Sob o mesmo céu: a confusão da palavra não dita

Dois minutos. Esse é mais ou menos o tempo que um filme tem para se apresentar, prender a atenção e ser o portão de embarque ou o motivo de desistência da viagem.
Teve um tempo em que eu era viciada nos primeiros dois minutos, gostava de montar a história toda neles, tentando cruzar informações. Desde então, se alguém me chama para entrar no cinema com o “só vamos perder o comecinho” eu já elimino da lista de amigos.
Em “Sob o Mesmo Céu”, lançado no início de 2015, os dois primeiros minutos entregam tudo o que o filme promete: Havaí, poder e armas. A Hula embala as imagens, o que entrega também a controvérsia que o filme é, intercalando bombas e negociações políticas com surfe, sol e gente feliz. Caso o Pearl Harbor não existisse eu teria parado o filme por aí. Mas o longa tem um bom elenco: Bradley Cooper, Emma Stone, Rachel McAdams, Bill Murray e Alec Baldwin, então vamos continuar.
Se os primeiros dois minutos entregaram a trama, os outros 100 conseguiram confundir. Brian Gilcrest(Bradley Cooper) é um militar fracassado que recebe uma segunda chance com a missão de voltar a sua terra natal (Havaí) para soltar um satélite. Mas para não pisar na bola dessa vez ele precisa de uma babá, a aplicada capitã Ng (Emma Stone). Só que logo na chegada ele reencontra um antigo amor (Rachel McAdams) e os dois ficam balançados mesmo ela sendo casada e com filhos. Ainda que o sentimento de Gilcrest pela ex-namorada exista, ele se envolve com a capitã Ng e a gente fica um bom tempo tentando entender o que eles querem de verdade. Os diálogos são confusos e sempre inconclusos.
Paralelo a isso, a missão de Gilcrest é secreta e, como toda história que não está clara, cada um sabe um pouco e ninguém sabe de nada. É aí que entramos no ponto alto do filme, que faz a história valer a pena ainda que a confusão esteja pegando, “Sob o Mesmo Céu” retrata a falta de comunicação. Toda a confusão se dá por causa de conversas que não aconteceram, seja no trabalho, seja em casa. Alguma coincidência com a vida por aí?
A palavra não dita fica ainda mais clara no personagem Woody (John Krasisnki), a personificação do problema e o lado cômico do filme, ainda que ele tenha menos sorriso que falas.
Foi a ausência de comunicação que me fez adorar o filme e escrever sobre ele. Desde que assisti “Porque Choram os Homens (Sally Potter, 2000)" tenho essa fixação por produções que usam o silencio pra mostrar as coisas. É um trabalho ingrato para os roteiristas – que não podem colocar nas falas o que os personagens pensam- e um trabalho ferrado de direção e montagem. Vou te falar, é lindo!
Aí eu penso que se os dois primeiros minutos podem ser os responsáveis por te manter assistindo os outros 100, em “Sob o Mesmo Céu” os dois últimos minutos me fizeram pegar o computador e escrever. O fim é óbvio, mas de uma delicadeza sem tamanho!
Claro que “Sob o Mesmo Céu” não é o melhor filme do diretor Cameron Crowe, principalmente para os loucos por “Jerry Maguire (1996)” e “Quase Famosos(2000)”, mas desde “Elizabethtown (2005)” é possível ver que, em se tratando de comédias românticas –água com açúcar e besteirol para muitos- ele tem se arriscado com trabalhos incríveis e mais populares sobre o comportamento humano. Querer que ele só faça filmes campeões de bilheteria é como esperar que James Cameron faça um “Titanic” por ano, ainda que ele acerte bastante sempre vai ter um longa protagonizado por piranhas que voam.
“Sob o Mesmo Céu” levantou nos EUA a discussão do porquê os atores são todos americanos brancos. Se você viu e não levantou essa discussão, parabéns, você nunca foi ao Havaí. Mas se você também levantou esse questionamento eu dou a minha explicação completamente pessoal: comecei a ver o filme porque os atores chamaram a minha atenção e apenas por isso. Com tanta comédia romântica no mercado é óbvio que as pessoas escolham as que tenham mais rostos conhecidos. Então se o filme é leve e precisa render ingressos no cinema, tem que ser assim. “Como se Fosse a Primeira Vez (Peter Segal, 2004)” tá na fila como exemplo disso também.
Por fim, o Havaí simplesmente não era necessário, mas quem consegue reclamar de um longa gravado nesse lugar? Vou assistir “Hawaii 5.0” só pra me manter no clima. Um bom 2016 pra vocês!!
Abaixo trailer de SOB O MESMO CÉU: https://www.youtube.com/watch?v=ShetvTxA1Gw

domingo, 28 de junho de 2015

Um ator sem amor

Eu nunca vou conseguir ver o Daniel Radcliffe sem pensar no Harry Potter. Nunca. Nem se ele se transformar no novo Jack Sparrow. Isso porque quando alguém cresce interpretando um personagem é o personagem que cresce nele, os trejeitos não mudam, se constroem. O que não faz de Radcliffe um ator tão ruim, só mais um ator marcado.
Quando comecei a ver “Será que?” a marca dele se reafirmou. O personagem é o mesmo e Radcliffe não consegue emplacar um bom romance nem com Cho, nem com Gina, nem com Chantry. Sabe aqueles filmes que quando o protagonista se revela apaixonado pela protagonista você sente um nó na garganta? Então, isso não acontece quando ele é o Radcliffe. E é exatamente por isso que ele combinou tanto com o Wallace de "Será que?".
Na trama Wallace está sozinho desde que a namorada o traiu há um ano. Ele está chateado? Bravo? Se sentindo traído? Não, ele só seguiu em frente sem esboço de sentimento algum. Um dia ele conhece Chantry (Zoe Kazan) e eles viram amigos. E ele continua querendo ser só amigo dela mesmo quando Chantry revela que namora há cinco anos com o bambambam das galáxiasONU, que cozinha e é um cara super bacana. Obviamente Wallace entra naquela Friend Zone não tão Friend assim, mas que todo mundo finge que é só Friend pra não causar intriga cedo demais.
Área com Spoiler. Pare aqui se não quiser saber como a coisa termina.
O que normalmente acontece nesses filmes?
1. O namorado não é tão perfeito, pisa na bola e Chantry fica com Wallace
2. Wallace e Chantry têm um caso,ela se arrepende, a amizade nunca mais é a mesma e na última cena os dois se reencontram após anos, sentem o constrangimento no ar e vão embora
(Poderia ter “3. Wallace sofre, esquece Chantry e segue a vida”, mas aí não teria motivo para fazer esse filme porque já existe e chama 500 Dias Com Ela.)
O que as duas opções acima têm em comum fora estarem no roteiro de 98% das comédias românticas? São drásticas. Sempre tem um rompimento dramático para algum lado. Mas foi exatamente aí que a falta de potencial para demonstrações amorosas do Radcliffe encontrou seu sentido na vida. O namorado da Chantry continua sendo perfeito, o Wallace não tenta nada com ela e mesmo após um momento de coragem para dizer tudo o que sente ele volta a ser o protagonista sem sal e deixa a garota seguir a vida. E ela casa com o namorado perfeito? Não. Ela termina com ele e fica com o Wallace? Sim. Por que, se o namorado não fez nada, era perfeito e o Wallace sem sal? Porque ela quis.
(Eu, sinceramente, torci pelo namorado perfeito. Ele era bem mais legal, seu único defeito era não ter matado o Voldemort.)
Mas felizmente -para algumas pessoas- infelizmente -para outras- a vida está cheia de rompimentos não dramáticos e inexplicáveis, que estão aí só para fazer todo mundo se perguntar: por que?
Portanto, “Será que?” é um filme tão sem sal quanto um Radcliffe apaixonado, mas conseguiu escapar do óbvio e ficar mais real, então vale às 1h40 perdidas se você não tiver nenhum Harry Potter para assistir.

terça-feira, 16 de junho de 2015

Jurassic World: a variação tecnológica da receita

Um homem que não tem com que gastar dinheiro cria um parque de diversões inovador. No lugar de montanhas-russas ele tem dinossauros. Entre os visitantes há familiares menores de idade e o escolhido para analisar as atrações segue a linha Indiana Jones. Há também alguém ambicioso, querendo ganhar vantagem naquilo tudo e, claro, um dinossauro cheio de dentes tocando o terror.
Resumidamente, estamos falando de Jurrasic Park, 1993. Não, péra. Estamos falando de Jurassic World, 2015.
No fim, a receita é a mesma, o que muda é a tecnologia. Obviamente seria difícil desbancar o clássico de Steven Spielberg de 1993. Ninguém conseguiu, nem mesmo as sequências O Mundo Perdido (1997), que receberia no máximo uma classificação ‘boa’, e Jurassic Park 3 (2001), que beira a classificação ‘sessão da tarde’.
Eu vi o filme de 1993 pela primeira vez em um VHS. Zero glamour, TV pequena, som mono, tudo analógico. Mas desde o momento em que vi meu primeiro dinossauro em CGI -já que antes meu imaginário pré-histórico era formado pela animação Em Busca do Vale Encantado (1988)- eu nunca mais enxerguei um dinossauro que não fosse de Spielberg.
Jurrassic Park não serviu só para fazer o espectador acreditar na existência desses animais, mas deu até aos pesquisadores algo para se instigar. Até 1993 ninguém imaginava como um dinossauro andava, com o que soava, os movimentos que fazia. Foi a equipe de Spielberg que deu isso ao mundo e o mundo agradeceu tornando os dinossauros de Spielberg referências fora da tela.
Como superar um feito desses?
Repetindo-o.
Jurassic World, que chegou aos cinemas na última semana, recria a mesma história do primeiro longa, com a ressalva de que o parque finalmente abriu e abriu 20 anos depois. Claro que a produção não poderia repetir a receita do T-Rex destruidor, que depois de tanto tempo ficou menor e menos assustador que muito arranha-céu por aí. Eles precisavam de novidade, algo maior, que despertasse o medo e a curiosidade da geração de hoje. Então surgiu a Indominus Rex, a versão mais assustadora do T-Rex com requintes genéticos. Filha da mistura em laboratório de tudo o que é grande, mortal e cruel, ela mata por esporte e não só enxerga movimento como sente vibrações térmicas (Chupa, T-Rex!).
E para os fãs um pouco mais apaixonados e que acabaram tendo tanto medo no passado que desenvolveram amor pelos velociraptores, o que é o meu caso, o filme é um deleite. A proposta de que pode haver respeito entre um humano e um dinossauro dá aquela empatia ao longa que a gente sentiu quando viu o Tricerátops doente no primeiro filme, quando você acha que pode SIM ter um dinossauro de estimação, ainda que ele queira te comer.
Jurassic World é a receita transgênica de Jurassic Park que ficou tão boa que já se tornou a maior estreia da história de Hollywood! A resposta nas salas de exibição é o resultado de vinte anos de evolução tecnológica do cinema, que permitiu ao espectador voltar a 1993 sem precisar sair de 2015. Na trama, passaram duas décadas desde o fechamento do primeiro parque e já se vão 20 anos desde a estreia do primeiro filme. O tempo que separa as produções foi muito bem utilizado para o sucesso delas e para que, mais uma vez, recriar dinossauros fizesse sentido.

domingo, 4 de janeiro de 2015

Um mito, um divisor de águas e o poder do boca a boca

2014 não foi um ano de muitas publicações... Tá, não foi ano de publicação nenhuma. Mas ainda assim alguns trabalhos foram desenvolvidos. Esse foi um texto que fiz por encomenda para a revista digital LIBRE!. Um pouco tarde, mas, para fãs de Tarantino, antes hoje do que nunca.
Eu tinha sete anos e pouco lembro sobre o que prende a atenção de uma criança com essa idade, mas posso garantir que uma estreia de cinema – a menos que fosse a de O Rei Leão (Disney, 1994) –não seria a opção mais tentadora. No entanto, eu me lembro de Pulp Fiction – Tempos de Violência.
Claro que hoje eu não poderia contar com clareza como foi que tudo aconteceu, mas é por isso que a criança de sete anos de 1994 encontra a mulher de 27 em 2014 para completar essas lacunas. Afinal, são vinte anos de um filme que não só mudou a história do cinema, como instituiu o mito Quentin Tarantino.
Pulp Fiction foi o segundo longa do diretor americano, que estreou nas telonas com Cães de Aluguel (1992). O primeiro filme já havia causado um reboliço em Hollywood e colocado o nome de Tarantino em evidência, mas as seis indicações ao Oscar (em que levou a estatueta de Melhor Roteiro Original) e a Palma de Ouro recebida em Cannes em 1994 o fizeram fincar a bandeira territorialista no letreiro de Hollywood e seu nome na calçada da fama.
Com Tempos de Violência Tarantino fez o que antes ninguém havia feito: estabeleceu o cinema independente no cartel cinematográfico. O longa custou $8 milhões para ser produzido e rendeu $200 milhões nas bilheterias mundiais. Foi um escândalo! E não é maneira de falar. A banalização da violência no filme virou assunto no mundo todo e o boca a boca foi o maior responsável por lotar as salas de exibição. Ainda hoje há quem não aceite o sangue derramado desordenadamente por Tarantino, que só perde o posto de diretor sanguinário para Martin Scorsese, que tem até uma cor própria, “o vermelho Scorsese”. Pulp Fiction teve até a repercussão comparada a outro clássico marcado pela violência: Laranja Mecânica (Stanley Kubrick, 1971), e os contextos e épocas eram bem diferentes.
Obviamente que com sete anos eu não era apta a ver o filme no cinema, mas lembro perfeitamente da silhueta de Uma Thurman e John Travolta dançando em uma chamada na TV aberta anos depois, quando o longa ia ser exibido. “O filme que chocou o mundo”, “o sucesso de bilheteria”, “o fenômeno mundial” eram as manchetes que incitavam as pessoas a assistir.
Eu não gostei do filme, sinceramente, no entanto nunca mais esqueci a cena da dança. Mas não virem a página! Eu tinha apenas oito, nove anos. É de se compreender que uma criança não se sinta afetada pela sedução tarantinesca a primeira vista. Ou a segunda. Ou até mesmo 20 anos depois. Sejamos claros, salvo os últimos grandes longas do diretor -Bastardos Inglórios (2009) e Django Livre (2012)-, que tiveram um roteiro um pouco mais linear, Tarantino não é lá um dos contadores de histórias mais fáceis de engolir. Tomando como princípio Pulp Fiction, eu sempre imaginei a tortura de quem teve que criar uma sinopse para o filme:
“Uma dupla de assassinos profissionais, que trabalha para um poderoso gângster, que se vê envolvido em uma situação constrangedora por perseguir um homem que lhe passou a perna, que tinha um relógio importante, que nada tem a ver com a esposa do gângster que é convidada para sair com um dos assassinos profissionais, mas não devia se envolver com drogas e tem um casal que apareceu na primeira cena e... Quem são eles mesmo?”
A chamada na TV deveria se resumir no máximo em “se metem em uma grande confusão!”, ainda que confusão explique melhor do que as linhas acima.
Portanto, é preciso paciência e bagagem cultural para assistir Tarantino, e eu não falo sobre seus diálogos de dez minutos ininterruptos sobre hambúrgueres em Pulp Fiction, falo sobre a falta de linearidade e a profundidade dos seus roteiros malucos que começam sem pé nem cabeça e terminam prendendo escandalosamente a nossa atenção.
Tempos de Violência é uma aula de cinema que vai além do Mise-en-scène. As referências à outros filmes e personalidades que fizeram parte da história da Sétima Arte e de outras artes são incontáveis: Marilyn Monroe, Elvis Presley, Martin & Lewis, Amos and Andy, Mamie Van Doren todos eles em apenas em uma cena. Até Ringo Starr, ainda que alguns o considerem o Beatles menos importante, teve seu nome lembrado.
Quentin Tarantino é um apaixonado pelo cinema, o dos outros e o dele. É possível cruzar takes de Pulp Fiction com Kill Bill (2003, 2004), Cães de Aluguel, A prova de Morte (2007), Jackie Brown (1997) e provavelmente com todos os outros filmes do diretor. No fundo, ele gosta de criar próprias referências mais do que se referir a outros.
E é por isso que não se assiste a filmes de Tarantino, você estuda-os. Porque para gostar de um longa desses requer-se um conhecimento prévio de outros tantos filmes que, sem essa bagagem, provavelmente o roteiro que começa sem pé nem cabeça iria terminar perdendo o resto do corpo e ser apenas um escândalo, sem sinopses.
Em 2014 Pulp Fiction comemora 20 anos como lenda do cinema, um divisor de águas que rompeu os rótulos que não permitiam que um filme pop fosse visto como clássico, que deu identidade ao cinema independente e criou o estilo Tarantino de fazer cinema: uma assinatura, uma marca mundial. Ainda hoje a película permeia centenas de listas de melhores filmes da história e provavelmente não perderá muitos lugares nos próximos 20 anos. Um viva ao cinema, a Pulp Fiction e ao gênero Tarantino.
**Texto encomendado para a revista digital LIBRE! em setembro de 2014.

domingo, 15 de dezembro de 2013

A plastificação da Terra Média

Em "O Hobbit: A Desolação de Smaug" Peter Jackson apresenta um mundo esteticamente tão perfeito que deixa de ser Terra Média para virar obra de arte
Em 2002 quando encarei uma fila de empolgação e gente na porta do cinema para ver o primeiro O Senhor dos Anéis havia em mim uma expectativa que apenas outro livro despertou: Harry Potter. O que as duas ficções me causavam em comum era a vontade de viver aquilo que, de alguma forma, eu conseguia ligar a minha realidade, fosse imaginando que um dia houve nesse mundo uma Terra Média, fosse pensando que havia bruxos nos fazendo de 'trouxas'… e que minha carta de ingresso em Hogwarts foi extraviada, talvez.
O que Peter Jackson, diretor do segundo longa da trilogia O Hobbit, fez comigo nesse novo filme foi encantador e ao mesmo tempo frustrante. Infelizmente o ponto ruim, a que me refiro nesse texto, é que nas 2h41 de longa Jackson arremessou de um penhasco toda a minha alma medieval e cuspiu na minha cara dizendo: Isso é um filme foda que provém de um livro de ficção, criança, agora volte para a sua realidade feia.
Sinopse. A história entra pela porta deixada aberta no final do primeiro longa. Após iniciar sua jornada ao lado de um grupo de anões e de Gandalf (Ian McKellen), Bilbo Bolseiro (Martin Freeman) segue em direção à Montanha Solitária, onde deverá ajudar seus companheiros de missão a retomar a Pedra de Arken, que fará com que Thorin (Richard Armitage) obtenha o respeito de todos os anões e o apoio na luta para retomar seu reino. O problema é que o artefato está perdido em meio a um tesouro protegido pelo temido dragão Smaug (voz de Benedict Cumberbatch). Ao mesmo tempo, Gandalf investiga uma nova força sombria que surge na Terra Média. -Via adorocinema.com.br
Plástica. Logo no início do filme a qualidade visual me incomodou tanto que tive a sensação que Thorin era perseguido por duas bonecas na estalaria do Ponei Saltitante. A cena, que pouca importância tem para o resto do filme, mostra como o anão e Gandalf se conheceram e, como em tantas outras, inclui o espectador em uma história não contada no livro, mas que, por vezes, ajuda a criar um contexto que nos leve a trama de "O Senhor dos Anéis". Não é o caso específico dessa cena, podiam jogar ela fora.
De qualquer forma estou certa de que a sala de cinema que escolhi para assistir ao "O Hobbit: A Desolação de Smaug" tem grande parte da culpa de toda a minha frustração, mas se é para ser um dos melhores filmes do ano, que seja visto mesmo em tecnologia Imax.
O fato é que a perfeição daquela Terra Média criada pelo diretor de fotografia Andrew Lesnie é tão deslumbrante que não cabe, para mim, no peso das cenas. Tudo se torna tão plástico que até meus olhos se acostumarem eu tinha certeza de estar assistindo a um jogo de videogamente em high definition. Some a isso uns ângulos de câmera esquisitos (ar de erro de movimentação, com direito a perda de foco e até uns chicotes) mais as passeadinhas na montanha-russa da grua para mostrar quão esteticamente lindos eram os cenários a cada nova cena e pronto, já podem vender o jogo pro PS4.
O tratamento de imagem foi feito de forma tão plástica que acredito que não reconheceria nenhum ator do filme se tropeçasse nele na rua. A tecnologia construiu algo tão perfeito que perdeu a conexão que poderia haver com o real e até a sujeira das unhas dos anões é artisticamente bonita. Pura obra de arte que incomoda.
Até você se acostumar.
Depois disso não há palavras para descrever o desenrolar de A Desolação de Smaug.
Ao contrário do primeiro longa “O Hobbit: Uma Jornada Inesperada”, esse conseguiu equilibrar perfeitamente o longo tempo que o diretor possuia com a ação e a história escrita por J.R.R. Tolkien. As inserções de personagens que remetem a primeira trilogia ficaram mais fundidas que no primeiro filme e acredito que quem não leu O Hobbit e resolva fazer isso futuramente vai estranhar a ausência de Legolas (Orlando Bloom) na história. A própria elfa Tauriel (Evangeline Lilly) criada apenas para a trilogia, se encaixa bem a trama, mesmo que em um triângulo romântico forçado.
Do meio para o fim do filme, quando finalmente nos deparamos com Smaug (ouso escrever que foi o melhor dragão já criado para o cinema - até o momento), a sensação é a mesma que Jackson causou no primeiro longa quando houve o encontro entre Bilbo e Gollum: você sente que esperou o dia todo para aquele momento e que sim, valeu cada minuto. É um êxtase não só crucial, como também responsável por fazer o espectador esquecer tudo que poderia não ter gostado do filme. Tanto o diálogo entre os personagens, quanto o final que rege a trama são de agradecer a tecnologia por poder ser usada para fazer cinema. É lindo, é sombrio, é de querer rebobinar.
E termina num épico momento sem fim -como aconteceu no primeiro filme-, deixando todos os espectadores órfãos de um merecido “The End”, mas congelados na poltrona com a frase “I am fire. I am death”, que antecede os créditos finais.
No fim, Peter Jackson, você pode ser até Monet se quiser. Do que eu estava reclamando mesmo?
Destaque. As coreografias de luta são os pontos mais cômicos do longa, com atenção especial para a que reune Orcs, Anões e Elfos no rio.

quinta-feira, 13 de junho de 2013

O hangover de Pacino, Walken e Arkin

Ontem um amigo me perguntou por que eu não parava de falar em “Stand Up Guys” (no Brasil chama “Amigos Inseparáveis”) e questionou o motivo de eu querer tanto mostrar o filme para ele. Listando as minhas considerações acabei por resolver fazer o mesmo para o blog, afinal, quem por acaso passa por aqui merece sair com pelo menos um filme para alugar que seja de convencimento meu. E de hoje em diante quando me pedirem dica de longas, sem dúvida, essa será uma.
A história é a seguinte, Val acaba de cumprir 28 anos de prisão e no dia de sua saída é recepcionado por Doc, seu antigo parceiro do crime. A amizade dos dois é colocada em xeque, uma vez que Doc foi escalado por um líder criminoso para assassinar Val assim que saísse da cadeia. As últimas horas da dupla precisam, então, ser aproveitadas da melhor forma: drogas, mulheres, perseguições, roubos, pancadaria, tiros e a reunião de velhos amigos.
Imaginemos o seguinte, “Hangover” ("Se Beber Não Case") é a franquia de comédia mais rentável dos últimos tempos, então temos em “Stand Up Guys” uma história no estilo “Hangover”, em que três grandes amigos têm menos de 24h para realizar vontades reprimidas. Mas calma, o que faz de “Stand Up Guys” um filme infinitamente melhor é a experiência contida nele.
Inicialmente experiência etária. Todos os fanfarrões envolvidos têm mais de 70 anos, o que faz da história engraçada por si só, além de ter aquela pitada de responsabilidade e vivência que só os anos podem proporcionar. Eles não saem destruindo tudo como se não houvesse amanhã, eles saem dando lições de moral a muito marmanjo como se não houvesse amanhã.
Continuando a falar de experiência, há um ponto que não carece discussão. Você tem Al Pacino, Christopher Walken e Alan Arkin protagonizando o longa. É de tirar o fôlego só de ver os caras juntos. Pacino com aquele olhar louco Scarface que é a única parte dele que não envelhece, Walken com seu jeito tão tranqüilizador que beira a psicopatia e Arkin que é sempre Arkin, que dá vontade de rir até quando está respirando por uma bomba de oxigênio. Para mim, o cara é o eterno avô da Little Miss Sunshine Olive, daquele filme sensacional que lhe rendeu um Oscar coadjuvante em 2007.
Acredito que a experiência já seria suficiente pra me fazer querer ver o longa, mas para os cinéfilos mais exigentes eu ainda tenho outros motivos para indicar “Stand Up Guys”. Eu diria que os três personagens são RocknRollas para Guy Ritchie nenhum botar defeito. E olha que para eu dizer que alguém fora o Mark Strong é um RocknRolla precisa muito, já que o personagem Tio Archie (RocknRolla) é amor eterno substituído apenas por Tony Montana (Scarface) e Travis Bickle (Taxi Driver).
Fora isso o filme tem um quê de Tarantino fenomenal. Não, não é Tarantino, mas por diversas vezes me lembrou o estilo “Cães de Aluguel”. O diretor, aliás, eu nunca tinha pesquisado e descobri que até vi uns filmes dele, mas só quando olhei bem a foto de Fisher Stevens percebi que a feição dele não me era estranha, o cara é conhecido por papéis secundários em diversos longas.
Um momento especial para mim em “Stand Up Guys” foi a cena que remeteu ao meu filme preferido com Pacino desde a infância. Eu sei que todo mundo pensa no “O Poderoso Chefão”, mas não, é “Perfume de Mulher”. Quem gosta do longa tanto quanto eu também vai se emocionar no momento em que o velho Al Pacino convence uma jovem a conceder a ele uma dança. Não há o glamour do hotel luxuoso, nem as notas de “Por Una Cabeza” e a cena até poderia ser descartada do filme, mas para mim foi de uma nostalgia de dar sorrisos bobos para TV. Fiquemos então com a cena original de “Perfume de Mulher” como inspiração AQUI.
Bom, e para finalizar a trilha de Stand Up Guys foi escolhida pelo Bon Jovi, já é a terceira vez que eu escuto toda ela hoje e a letra de Not running anymore está começando a me causar sensações esquisitas. Portanto, o filme vale para quem gosta de música, quem gosta de comédia, quem gosta de Tarantino, Guy Ritchie, de Pacino, Walken e Arkin ou para quem só quer ver um bom filme.
“It’s time to kick ass, or chew gum. And guess what? I’m all out of gum.”
TRAILER "STAND UP GUYS"